Foto: Airumã Thug e Museu do Inusitado
Até o dia 30 de agosto, quem visitar algumas bibliotecas públicas de São Paulo terá a oportunidade de vivenciar um encontro multiartístico e cultural, a partir da integração entre as artes plástica, corporal, literária e musical. Tudo isso em formato de um Sarau organizado pelo coletivo Museu do Inusitado. Com um espaço criado oficialmente em 2015, entre as regiões do Capão Redondo e Jardim São Luís, na capital paulistana, o Museu surgiu com o intuito de atender a necessidade de infraestrutura para ensaios e reuniões de artistas e produtores culturais do entorno.
Aberto a todos os interessados, o Sarau vem proporcionar, de forma dinâmica, uma interação entre os participantes e as diferentes linguagens artísticas. De acordo com o músico-educador, artista e produtor de eventos Luís Vitor Maia, idealizador e fundador do Museu do Inusitado, a intenção do evento é propiciar uma rica troca de saberes, reconectando o público e artistas presentes às formas ancestrais de transmitir conhecimento por meio da oralidade e da convivência.
“Todos os seres humanos têm direito à livre expressão através da música, poesia e arte. A partir dessa premissa, o coletivo promove esses encontros multiculturais que buscam, no fazer artístico, nas tradições, na oralidade e no compartilhamento de experiências, nossos grandes potenciais de aprendizado”, completa o músico-educador.
O evento é promovido por artistas frequentadores do Museu que, em 2021, gravaram uma coletânea audiovisual com cantos indígenas, brincadeiras e danças brasileiras de origem africana, com apoio do ProAC 2021/40.
Documentário sobre as vivências indígenas das Aldeias Takua Ju Mirim e Yrexakã
Além do Sarau, o público poderá acompanhar a exibição de um documentário, produzido pela equipe do Museu do Inusitado, que abordará a relevância das aldeias Takua Ju Mirim e Irexakã, situadas em São Paulo (nos distritos de Parelheiros e Marsilac), para a preservação e resistência da cultura indígena, seguido por um bate-papo com o professor de Literatura Brasileira, Júlio César Pereira de Freitas Guató (Karaí Jekupe, seu nome em guarani), da etnia guató, que estará presente em toda a programação do Sarau.
Localizada nas proximidades do rio Capivari, principal rio das terras indígenas Tenondé Porã, da etnia guarani mbiá, a aldeia Yrexakã é muito procurada para atividades de ecoturismo e turismo de aventura, como a realização de trilhas que levam aos muitos pontos de banho e cachoeiras ao longo do Capivari. O terreno ainda abriga um manicômio abandonado, utilizado para acolher visitantes e parentes de seus habitantes. Já a Takua Ju Mirim é uma extensão da Yrexakã e se diferencia das demais aldeias por ser um núcleo indígena composto unicamente por mulheres, segundo o Professor Guató.
Como forma de preservar a cultura indígena dessas aldeias, suas lideranças vêm buscando meios de reestruturação do local para a criação de um espaço cultural que proporcione experiências de troca entre seus moradores, outros indígenas e grupos de pessoas e associações interessados em promover ações afirmativas para a região; tão pouco assistida pelos poderes públicos, até mesmo pela dificuldade de acesso, como nos aponta Maia.
Diante disso, o fundador do Museu do Inusitado conta que fez uma parceria com a aldeia Yrexakã, a fim de poder contribuir com o fortalecimento da identidade do local. “Já existe uma construção na região, porém, ela precisa ser revitalizada. Por isso, nós, do coletivo, queremos iniciar esse processo, juntamente com os indígenas, por meio de reformas, pinturas, e, também, outras atividades, como a produção de hortas coletivas, com alimentos tradicionais dos guaranis. Além disso, o próprio Sarau contará com a participação de lideranças indígenas, em uma mesa redonda, nos dias 28 de julho e 9 de agosto para falar a respeito da preservação da cultura indígena.
Nascido em Corumbá (MS) e atuante no fortalecimento de ações em prol das aldeias Takua Ju Mirim e Irexakã, Guató exalta a importância da parceria com o Museu do Inusitado, por constituir o cerne da resistência indígena, que é justamente o registro de sua cultura. “Nós sofremos um apagamento generalizado, uma invisibilização incrível em todos os sentidos e, até mesmo o povo branco, vê a nossa cultura com uma determinada estereotipização. Por isso, preservá-la significa, acima de tudo, respeito por mantermos os nossos hábitos tradicionais, mesmo em um contexto urbano.
Porém, o professor também ressalta a falta de respeito pelos povos indígenas nas diversas regiões do Brasil, diante da invasão de suas terras para o agronegócio, construção de imóveis e inúmeras outras atividades. “Nós lutamos contra todo e qualquer resquício de racismo que sofremos e, por isso, estamos tentando, por meio das comunidades de Yrexakã e Taquaju Mirim, preservar o bem-viver.” Essa palavra, inclusive, está ligada ao termo indígena de aldeia (tekoa), que, segundo o professor, significa lugar sagrado, onde seus moradores vivenciam a prática do bem-viver. “É nesse ambiente sagrado que existimos e praticamos o nosso estar em consonância com o universo e a mãe terra. O mundo só acontece para a gente a partir do outro e o outro tem que ser respeitado, assim como nós devemos ser respeitados”, completa.
A fim de lutar contra toda forma de apagamento, o professor ainda afirma que uma das principais formas de preservação da identidade local ocorre por meio da conservação da língua. “É através dela que a nossa herança é passada, juntamente com nossa ideia de luta, resistência e conhecimento”, conclui.
Quem quiser participar do Sarau, basta conferir a programação abaixo: 16/07, às 11h: Biblioteca Gylberto Freyre Rua José Joaquim, 290 - Parque Luis Mucciolo, São Paulo
28/07, às 17h: Biblioteca Paulo Duarte* Rua Arsênio Tavolieri, 45 - Jardim Oriental, São Paulo
06/08, às 17h: Sarau Online pela Casa de Cultura Parelheiros Acesso por
aqui 09/08, às 14h30: Biblioteca Rubens Borba Alves de Moraes* Rua Sampei Sato, 440 - Jardim Matarazzo, São Paulo
12/08, às 13h: Biblioteca Anne Frank Rua Cojuba, 45 - Itaim Bibi, São Paulo
20/08, às 14h: Biblioteca Raimundo de Menezes Av. Nordestina, 780 - Vila Americana, São Paulo
23/08, às 10h: Biblioteca Vinícius de Moraes Rua Jardim Tamoio, 1119 - Conj. Res. José Bonifácio, São Paulo
26/08, às 14h: Biblioteca Affonso Taunay Rua Taquari, 549 - Mooca, São Paulo
30/08, às 10h: Biblioteca Brito Broca Av. Mutinga, 1425 - Vila Pirituba, São Paulo
*com participação da líder indígena Luciana Yvã e do Pajé Nino Mais informações sobre o Museu do Inusitado, acesse o insta @museudoinusitado