O ministro Benedito Gonçalves, corregedor-geral eleitoral, deu o primeiro voto para condenar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) à inelegibilidade por uso eleitoral das comemorações do Bicentenário da Independência, em 7 de setembro do ano passado. O ministro também impôs multa de R$ 425 mil ao ex-mandatário.
Benedito ainda fixou multa ao general Walter Braga Netto em R$ 212 mil, mas poupou o então candidato a vice da punição de inelegibilidade. É a primeira vez que o militar é punido pelo tribunal por atos de campanha.
Ainda restam os votos de outros seis ministros. Neste momento, vota Raul Araújo.
Bastidores, opinião e análise dos fatos mais relevantes da política, na palma da sua mão. Baixe o app UOL
O voto de Benedito reforça a tendência pela condenação de Bolsonaro pelo TSE por abuso de poder político e econômico e uso indevido dos meios de comunicação. Se confirmada a expectativa, será a segunda vez que o ex-presidente é punido com a inelegibilidade.
A primeira condenação ocorreu em junho, por 5 a 2, no caso da reunião com embaixadores, ocasião em que Bolsonaro reciclou mentiras sobre o processo eleitoral em um encontro com representantes estrangeiros.
A situação de Bolsonaro não se altera. As penas não se somam, pois contam oito anos a partir de 2022 em ambas as condenações. No entanto, a nova punição deve ampliar o desgaste político do ex-presidente a um ano das eleições municipais de 2024.
Desta vez, o TSE se debruça sobre a conduta do ex-presidente durante o 7 de Setembro. As ações foram apresentadas pelo PDT e pela senadora Soraya Thronicke, então candidata à Presidência em 2022.
Ambos alegam que, após o desfile militar em Brasília, Bolsonaro se deslocou a um trio elétrico nas proximidades do evento para discursar a apoiadores, utilizando assim da estrutura pública para ato de campanha.
No Rio de Janeiro, ele falou em um palanque montado em Copacabana —local escolhido pelo Exército para as festividades, que até então eram conduzidas no centro da capital fluminense.
Benedito Gonçalves apontou que Bolsonaro convocou apoiadores, desde as convenções partidárias e por meio de entrevistas e declarações públicas, a participarem das comemorações cívicas. Apesar de ser um evento do Estado, a linguagem utilizada deixava claro, segundo o ministro, que a participação desejada era somente de seus apoiadores.
“O chefe de Estado, fazendo-se de candidato e vice-versa, não deixou qualquer espaço para que o pluralismo político coubesse na comemoração cívica”, disse o ministro.
O objetivo não precisou ser explicitamente anunciado, já que foi anunciado por símbolos potentes: patriotismo, demonstração ostensiva do poder militar, defesa da liberdade. A militância convocada para a celebração do Bicentenário da Independência no curso do período eleitoral recebeu como derradeira missão mostrar a força da candidatura do investigado em uma luta do bem contra o mal.Benedito Gonçalves, corregedor-geral eleitoral
Em relação à participação a Braga Netto, Benedito Gonçalves aplicou uma multa de R$ 212 mil ao militar, mas o salvou da inelegibilidade.
Se acompanhado pelos colegas, será a primeira vez que Braga Netto será punido em uma ação de investigação eleitoral. Mesmo assim, ele seguirá elegível para disputar as eleições do ano que vem.
Em voto, Benedito Gonçalves afirmou que não era possível considerar que o militar não tinha conivência dos fatos. Isso porque ele também era responsável pela regularidade do material divulgado por Bolsonaro, inclusive as propagandas eleitorais.
Além disso, o militar era o ministro da Defesa à época em que foi enviado o primeiro pedido para alterar o desfile militar no Rio de Janeiro, o que demonstraria ter tido ciência dos preparativos das comemorações.
O segundo investigado também era responsável pela regularidade do material de propaganda exibida nas inserções eleitorais, não sendo possível considerar que tudo se passasse sem a sua plena conivência com a associação entre a candidatura da chapa e a comemoração do Bicentenário da Independência.Benedito Gonçalves, corregedor-geral eleitoral
Tratores do agro e Luciano Hang: o que pesou no voto de Benedito
Além das convocações a eleitores, Benedito Gonçalves apontou outras atitudes de Bolsonaro que caracterizariam uma apropriação do evento público em prol de um ato de campanha.
Uma destas condutas foi a participação de tratores ligados ao agronegócio durante o desfile militar, mesmo sem ter ligação com o evento. Houve ainda a presença de empresários próximos ao ex-presidente, como Luciano Hang, em locais de honra ao lado de Bolsonaro, em Brasília.
No Rio de Janeiro, o Exército alterou o local da cerimônia do 7 de Setembro, deixando o centro da capital para a orla de Copacabana, espaço utilizado para atos bolsonaristas no passado. Nas proximidades, foi montado um palanque em que Bolsonaro discursou a apoiadores após uma motociata.
“A mudança de local foi determinada pelo Ministério da Defesa, atendendo aos interesses direto do primeiro investigado”, disse Benedito Gonçalves. “Não há como negar a relevância simbólica de levar a parada militar a local de encontro de sua militância.”
A orla de Copacabana foi transformada em uma aquarela eleitoral, no qual o candidato à reeleição pode mesclar o poder político decorrente do cargo, simbolizado pela performance militar de grande visibilidade, e seu capital eleitoral simbolizado pela maciça presença de apoiadores à motociata e ao comício. Benedito Gonçalves, corregedor-geral eleitoral
Ala alinhada está desfalcada
Para agravar a situação de Bolsonaro, a ala mais alinhada ao ex-presidente está desfalcada no tribunal. O ministro Nunes Marques, que tende a dar votos mais favoráveis ao ex-mandatário, está em um congresso internacional e não participa da sessão de hoje.
O primeiro substituto, André Mendonça, também não pode vir ao TSE em razão de compromissos de agenda. Assim, quem participa do julgamento hoje é o ministro Dias Toffoli.