10/10/2024 às 07h54min - Atualizada em 10/10/2024 às 07h54min

Rios da Amazônia renovam recorde de baixa, mas preparação da indústria evita o pior na logística da Zona Franca, diz Cieam

Cieam, entidade que representa a indústria do Amazonas, estima prejuízo deste ano em R$ 500 milhões, um terço do registrado em 2023

Foto Divulgação

O Rio Negro atingiu seu menor nível em 121 anos de medições, mas a logística das indústrias instaladas na Zona Franca de Manaus está se saindo melhor do que no ano passado. O Cieam, entidade que representa a indústria do Amazonas, espera que, neste ano, o prejuízo com as restrições ao transporte seja de R$ 500 milhões, quase um terço do R$ 1,4 bilhão estimado para 2023, de acordo com reportagem publicada no jornal O Globo.

A preparação para enfrentar a estiagem, com a antecipação do transporte de mercadorias — tanto na chegada de insumos quanto no envio dos produtos para o resto do país — e a construção de cais temporários no Rio Amazonas, está evitando o pior, disseram executivos e especialistas.

Com 2 milhões de habitantes e no meio da Amazônia, Manaus depende dos rios para o transporte. Na seca passada — sempre de agosto a dezembro —, navios de carga ficaram em torno de 45 dias sem conseguir chegar a Manaus.

Sem navegabilidade nos rios, comunidades ribeirinhas ficam isoladas, o frete encarece além do normal na estiagem e faltam suprimentos, alimentos inclusive, levando a fome aos mais isolados.

Além disso, ano passado, as indústrias instaladas na Zona Franca — que concentra boa parte da produção nacional de TVs, micro-ondas, ar-condicionado e lava-louças — tiveram dificuldades tanto para receber componentes quanto para mandar os produtos acabados para o resto do país.

— A seca, de fato é maior (do que em 2023), tivemos um novo recorde (de baixa nos rios), mas a adaptação é incomparável — afirmou o coordenador da Comissão de Logística do Cieam, Augusto César Rocha.

Resultados recentes de sondagens de percepção com as indústrias instaladas no Amazonas corroboram o quadro mais favorável. Segundo Rocha, 16% dos entrevistados esperam até uma queda nos custos com logística.

‘Operação Itacoatiara’ surte efeitos

A Operação Itacoatiara, como foram batizados os dois projetos de pilares flutuantes temporários construídos na cidade que fica a 270 quilômetros por terra a leste de Manaus, está operando há cerca de um mês.

As iniciativas são do Grupo Chibatão e pelos Super Terminais, operadores de terminais de contêineres que atendem ao polo industrial da Zona Franca, com apoio do Cieam e de órgãos dos governos estaduais e federais.

Os cais ficam no meio do Rio Amazonas, antes de chegar a Manaus para quem navega subindo contra a correnteza, num ponto onde a profundidade, mesmo na seca, permite a navegação dos cargueiros.

Nas estruturas temporárias, os navios atracados de um lado, e os contêineres são transferidos para as balsas, atracadas do outro lado. O percurso até Manaus leva mais de 12 a 18 horas.

Cabotagem responde por 60% do transporte de cargas para Manaus

Segundo o Cieam, a cabotagem (navegação pela costa de um mesmo país) responde por 60% do transporte de cargas até o entorno de Manaus — o segundo maior modelo de transporte é o “rô-rô caboclo”, como é chamado na Amazônia o transporte de caminhões em balsas.

Na cabotagem, os navios de carga levam contêineres dos principais portos do país. Todos os anos, quando os rios baixam na seca, a carga é reduzida para que as embarcações navegassem com profundidade menor, mas as estimativas de 2023 e 2024 foram tão severas que inviabilizaram a passagem até com carga reduzida.

 

Segundo o diretor-executivo do Grupo Chibatão, Jhony Fidelis, em um mês de operação, o cais de transbordo instalado pela empresa em Itacoatiara movimentou “mais de 8 mil contêineres”, em dez navios. A empresa investiu R$ 280 milhões no projeto de cais temporários.

— Se hoje não há desabastecimento no Estado do Amazonas, é graças a essa estrutura que foi montada para minimizar o impacto da estimativa — afirmou Fidelis.

De acordo com Rocha, da Comissão de Logística do Cieam, a operação tem funcionado bem, com apoio da Receita Federal e demais órgãos públicos, que acompanham o transporte das mercadorias, mas deixam para fazer os trâmites aduaneiros em Manaus.

A Eletros, associação dos fabricantes de eletrodomésticos, também confirma que a logística durante a estimativa deste ano está funcionando melhor do que no ano passado.

Obras de dragagem começarão neste mês, diz Dnit

Além disso, as obras de dragagem dos rios atrasarão, mas deverão começar ainda este mês, garantiu o Dnit, Órgão do Ministério dos Transportes responsável por essa área.

“Quatro contratos já foram assinados, e atualmente as equipes estão em fase de mobilização para iniciar a dragagem, programada para a segunda quinzena de outubro”, informou o Dnit, em nota enviada ao GLOBO.

Em agosto, o órgão federal já havia informado que destinaria um investimento total de R$ 768 milhões para obras de dragagem na Região Norte. Haverá obras nos leitos fluviais em trechos dos rios Amazonas (entre Manaus e Itacoatiara) e Solimões (entre Coari e Codajás; Tabatinga e Benjamin Constant; e Benjamin Constant e São Paulo de Olivença).

“A contratação para cada trecho terá um prazo de cinco anos, garantindo um serviço contínuo e essencial para a manutenção da navegabilidade”, diz a nota do Dnit.

Medidas são paliativas, dizem executivos

Luís Fernando Resano, diretor-executivo da Associação Brasileira de Armadores de Cabotagem (Abac), que representa operadores especializados nesse tipo de transporte, ressalta que, dadas as capacidades envolvidas, houve alguma fila de navios nos terminais de transbordo em Itacoatiara, o que atrasa um pouco o transporte, mas o abastecimento é garantido.

– Melhorou. Não é tão ruim quanto no ano passado, embora a seca esteja pior, mas a solução é paliativa — disse Resano.

Rocha, da Comissão de Logística do Cieam, concorda com a avaliação de que as soluções que tornaram a logística deste ano melhor, na comparação com 2023, são paliativas. Até as obras de dragagem, mesmo aquelas feitas de forma contínua ao longo dos próximos anos, podem ser insuficientes para oferecer uma solução definitiva para a logística no coração da Amazônia.

— É preciso estudar soluções mais definitivas — afirmou Rocha, lembrando que os impactos ambientais da dragagem dos rios não são pequenos. — Acredito que o melhor seria fazer um canal (no rio, para garantir navegabilidade o ano inteiro). É melhor estudar antes de arrastar direto.


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